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Anúbis, o Deus Egípcio da Mumificação

Entre os notáveis protagonistas do antigo panteão do Egito, encontra-se Anúbis, uma deidade de grande influência cuja função evoluiu ao longo do tempo. Antes que Osíris e Ísis emergissem como figuras de destaque, Anúbis era reverenciado como o deus dos falecidos.

À medida que Osíris assumiu esse papel, Anúbis redirecionou sua esfera de influência para se tornar o guardião da mumificação, sendo comparado metaforicamente como um descendente de Osíris.

Apesar de sua relevância e veneração ao longo de milênios, Anúbis raramente figurava como personagem central nos contos míticos egípcios. Ele desempenhou um papel crucial na narrativa do assassinato de Osíris, durante a qual desempenhou o papel de embalsamador do deus falecido.

Como consequência desse evento, ele foi reconhecido como o Senhor dos Enfaixamentos Mortuários.

 

Origem Etimológica

Assim como muitos aspectos do panteão egípcio, o nome de Anúbis chegou até nós através de uma tradução grega de seu nome original egípcio. Esse fenômeno ocorreu em parte devido à contínua adoração ou, ao menos, apreciação dos deuses egípcios pelos gregos. Além disso, a ambiguidade do sistema de escrita sem a inclusão de vogais adotado pelos antigos egípcios também contribuiu para esse processo.

Uma transliteração precisa, embora intraduzível, de seu nome em antigo egípcio é “jnpw”. Algumas interpretações de “jnpw” renderam o nome egípcio de Anúbis como “Anpu” ou “Inpu”. Além disso, o deus foi agraciado com múltiplos epítetos.

 

Características e Genealogia

Por ser uma das deidades mais icônicas do Egito antigo, ele possuía atributos distintivos notáveis. Apesar de ter uma forma humana, característica comum entre os deuses egípcios, sua cabeça e cauda de chacal o distinguem. Sua representação tipicamente negra frequentemente o retratava sentado.

Assim como diversos outros deuses egípcios, Anúbis possuía a habilidade de metamorfose, como evidenciado por sua transformação instantânea em um lagarto após testemunhar o corpo sem vida de Osíris.

Ele nutria uma devoção fervorosa por Ísis, que o adotou após ser abandonado na infância. Ele também era um guerreiro destemido, frequentemente triunfando sobre o deus Set em batalhas épicas.

Sendo uma das divindades mais antigas do panteão egípcio, a mitologia que circunda o deus é diversificada, porém por vezes inconsistente. Inicialmente, Anúbis era tido como filho de Rá, que ocupava o papel principal entre os deuses dos mortos.

Com o passar do tempo e o crescimento do culto a Osíris, as histórias que envolviam Anúbis foram gradualmente absorvidas por esse novo e expansivo mito.

Em uma versão alternativa, Anúbis emergia como filho ilegítimo de Nephthys e Osíris. Nessa narrativa revisada, Nephthys o abandonava por temor de que seu esposo, Set, descobrisse sua infidelidade, sendo posteriormente resgatado e adotado por Ísis.

Em outras vertentes mitológicas, ele era concebido como filho de Bastet ou Set.

Um relato notável, o “Conto dos Dois Irmãos”, introduz Anúbis com um irmão mais jovem chamado Bata. Entretanto, essa divindade regional ancestral, Bata, não resistiu à passagem do tempo ou às vicissitudes das transformações religiosas.

Em narrativas que o associam a Osíris como filho, Anúbis era dotado de vários irmãos, incluindo Horus, Babi, Sopdet e Wepwawet.

 

A Mitologia de Anúbis

As raízes e o papel intrínseco de Anúbis como deus dos falecidos estavam estreitamente ligados à sua representação como um chacal ou uma figura com cabeça de chacal. Os chacais, por serem animais necrófagos frequentadores de cemitérios e capazes de localizar sepulturas rasas, podem ter influenciado os egípcios a atribuir-lhes características benevolentes.

Outra perspectiva sugere que a adoração de Anúbis poderia ter surgido como um meio de exercer controle sobrenatural sobre os chacais. Ao adorar o deus devidamente, os egípcios esperavam aplacar os chacais e evitar perturbações aos mortos venerados.

Nos primórdios da história egípcia, Anúbis era reverenciado como o deus dos falecidos. No entanto, com o destaque cada vez maior de Osíris, o seu papel  passou por uma transformação. Ele evoluiu para se tornar o deus da mumificação e um psicopompo, encarregado de guiar os falecidos em sua jornada rumo à vida após a morte.

Uma seção do Papiro de Ani mostrando a “pesagem do coração”, retratando Anúbis manipulando a balança, pesando o coração do falecido contra a pena da verdade de Maat. (Domínio Público)

No período posterior ao Tardio (664-30 a.C.), Anúbis tornou-se associado a necromantes. Os feitiços demóticos, escritos em uma forma de linguagem que substituiu os hieróglifos, frequentemente convocavam Anúbis para servir como intermediário, facilitando a comunicação entre os vivos e os espíritos ou deuses do submundo.

Uma das versões mais conhecidas da origem de Anúbis foi preservada pelo historiador grego Plutarco (46-120 EC). Após o trágico assassinato de Osíris às mãos de seu irmão Set, a deusa Isis empreendeu uma busca desesperada pelo corpo de seu marido. Foi durante essa busca que ela descobriu que sua irmã Nephthys havia dado à luz um filho de Osíris.

Temendo a ira de Set ao descobrir sua traição, Nephthys abandonou a criança recém-nascida. Com sua compaixão maternal bem conhecida, Isis encontrou a criança e a acolheu como própria, nomeando-a Anúbis. Ele se tornou um leal protetor e seguidor fiel de Isis.

 

Anúbis e a Mumificação de Osíris

Após o assassinato de Osíris, seu corpo foi finalmente recuperado, independentemente de ter sido desmembrado, como sugerem relatos gregos de historiadores como Plutarco, ou simplesmente ter sofrido a decomposição natural.

O fato relevante é que, uma vez recuperado, o corpo de Osíris passou pelo processo de mumificação. Esse ato cultural teve origem a partir dessa primeira mumificação e tinha a intenção de espelhar a jornada de Osíris em direção à vida após a morte.

Quando Isis recuperou o corpo de seu marido, o próprio deus-sol Rá convocou Anúbis para auxiliar no processo de mumificação. Com o auxílio de Horus e Thoth, Anúbis envolveu o corpo em faixas e conduziu o ritual conhecido como “abertura da boca”.

Esse ritual tinha como objetivo garantir que os sentidos do indivíduo mumificado permanecessem funcionais na vida após a morte.

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